Bump é uma palavra da lingua inglesa que de acordo com o dicionário de oxford (que é de onde o google tira) pode significar uma protuberância a nível de superfície. Também pode significar uma batidinha leve. E eu gosto que bump serve de onomatoṕéia pras duas coisas, “ops — bump — bati a traseira do carro nessa árvore que apareceu do nada enquanto eu estava manobrando” e, claro, BUMP! quando passamos meio desavisados sobre uma protuberância no chão, a famosa lombada.
É dela que quero falar hoje. Não por nada mais que movida pelo profundo desespero toda vez que preciso dirigir sobre umas lombadinhas mequetrefes no estacionamento do supermercado. Eu tenho certeza que aquilo não está apenas detonando meu carro mas também minha alma.
Eu mesma conheço por lombada, mas um termo comum pra se falar delas é quebra-molas e isso não é a toa. O sistema amortecedor + pneus precisa dar conta dessa protuberância no meio do caminho sem quebrar e, pra isso, é melhor que o carro esteja em baixa velocidade.
Então, no fim das contas, uma lombada nada mais é que um jeitinho mais incisivo de colocar um limite de velocidade num trecho do caminho. A gente sabe que ninguém respeita os limites mesmo, então bora botar uns obstáculos no meio do caminho pra garantir. Talvez por isso o nome sleeping policeman (policial dormindo) parece ser também um nome para lombadas no Reino Unido. Não exatamente para lombadas-quebra-mola desses que a gente vê numa rua larga e “oficial”.
Porque tem isso também, existem lombadas e lombadas. E não to nem falando “existe lombada de rua e lombada de livro”. Só nas de rua mesmo, o CONTRAN define dois tipos a maiorizinha, tipo A, com 3,70 m de comprimento e entre 8 e 10 cm de altura, é indicada para quando a velocidade precisa ser reduzida a 30 km/h. A menorzinha, a tipo B, tem 1,5m de comprimento e altura entre 6 e 8 cm.
E tem as lombadinhas, que são os policiais dorminhocos, geralmente de borracha densa ou outro material sintético, que são postas em ruas particulares, condomínios ou supermercados. E é contra essas aí que vive meu maior problema. Não que seja agradável você estar um ônibus um pouco mais apressado e sentir seu traseiro descolando da cadeira. Mas essas pequenas aí não tem condição de não ser um estrago. Você percebe o carro se desfazendo enquanto passa por ela [1]. Essas de borracha tem dimensões diminutas: com altura de 5 ou 7 cm, elas tem cerca de 1m de comprimento só.
Mas aqui eu tirei a trigonometria no triângulo retângulo do armário [2] e fiz umas continhas e olha só: enquanto você vai passar numa lombada tipo B você vai sentir aí uma inclinação de 6°, na de borracha esse ângulo de inclinação vai ser de praticamente 8°!!! A gente quase que precisa passar por um degrau!!! É um absurdo!
Dizem por aí que essas sleeping policeman servem para reduzir a velocidade para valores entre 5-10 milhas por hora, ou seja, de 8 a 16 km/h, vamos colocar aí um valor médio de 12 km/h e passar pela lombadinha. Vai parecer menos danoso? Não. O carro faz menos barulho? Não. Não existe velocidade ideal.
Velocidade Ideal
Mas aqui venho falar de um artigo primoroso de um físico igualmente primoroso, o Vanderlei Bagnato. Na Revista Brasileira de Ensino de Física de dezembro de 1998 ele faz traz um estudo lindíssimo da velocidade ideal que um carro, aproximado para um sistema massa mola amortecido passando por uma lombada que é a porção positiva de uma função seno.
Nessa proposta ele chega a seguinte conclusão:
É a relação que a velocidade v do carro tem com as outras grandezas para que o passageiro e o motorista não se sintam desconfortáveis. L é o dobro do comprimento da lombada, M é a massa do carro, K é a constante da mola do amortecedor (que diz o quanto ela é dura) e $\eta$ é a constante de amortecimento. Claro que eu fiz as contas com vários chutes (fundamentados, lógico) e o resultado variou entre 20 e 28 km/h. O que faz sentido na proposta da lombada tipo A.
Mais físicos
E eu não vou explicar nada da física porque já deixei a referência e isso aqui é uma newsletter não um artigo científico mas eu vou trazer mais um tiquinho de física pra história que, provavelmente, só vai empolgar pessoas esquisitas como eu e outros físicos, mas…
Compton foi um físico notável. Ganhador do Nobel e de um efeito com o próprio nome.
O espalhamento Compton é mais ou menos assim: tá vindo um fóton (particulazinha de luz) de raio X, na dele, andando na paz, em linha reta como ele só sabe fazer. Daí ele encontra um elétron no meio do caminho. Como quem encontra uma lombada. Mas daí ele não diminui a velocidade. Ele faz tipo eu quando encontro uma lombadinha de borracha: dá uma desviadinha. Não sem antes dar um pouquinho de energia pro elétron. E é isso: ele dá energia pro elétron e segue a vida, agora numa outra reta, com menos energia. Enfim, não precisa se prender ao efeito, foco no cara.
Compton era um físico na Washington University e interessado em diminuir o perigo das ruas ele, em 1953, estudou um pouquinho formatos de lombadas duplas ou únicas. Diferente da nossa, a dele é mais como um trapézio, um triângulo com a ponta chata, mas tinha o exato mesmo propósito.
Essas lombadas foram implantadas na universidade e existiram por lá por um bocado de tempo.
Sei lá, acho bacana pensar que um ganhador de Nobel numa área tão específica também se dedicou a pensar coisas super mundanas e fez uma lombada menos horrorosa que aquelas atrocidades de borracha.
E ah! a Lombada eletrônica? Aparentemente é invenção brasileiríssima.
[1] Talvez ajudasse se eu dirigisse um carro mais inteiro. Com o escapamento caindo aos pedaços eu sinto que as lombadinhas só faziam, mesmo, o carro ir quebrando aos poucos.
[2] Não tirei trigonometria do armário coisa nenhuma que eu sou professorinha de matemática isso aí é apenas mais um dia comum. E meus alunos vivem perguntando “pra que eu preciso aprender isso??” Ta aí! pra reclamar!
O que eu andei aprontando
Essa é uma newsletter quinzenal que é para eu ter tempo de aprontar coisas no meio do caminho. Mas entre decidir fazer uma segunda graduação, trabalhar 50h/semana e ainda querer ir na academia e na natação, eu não to aprontando muitas coisas não.
Mas saiu um episódio do Tortinha de Climão sobre Fumaça.
Sugestões
Finalmente essa newsletter tá tomando a forma que eu queria que ela tivesse desde o início: eu dando minhas palestrinha sobre coisas. Sendo assim eu aceito sugestões de coisas que vocês acham que valem receber uma atençãozinha diferenciada.
Obrigada por lerem <3